Minha mãe nunca varria à noite,
nunca nos deixava varrer. O ruge-ruge da vassoura,
dizia ela, acordaria os mortos.
Aqui está uma dança para te fazer tremer
no chão gasto da cozinha.
Uma vez vi-a chorar de raiva e dor,
A derramar gasolina de isqueiro,
como uma ribeira de mijo, vazando
a vida no chão. Vou queimar
esta maldita casa. Não viemos
da nossa terra para agora vivermos assim.
Falávamos não de nós, mas dos velhos,
Daquele pobre barco do Pico.
O meu padastro sem conseguir acalmá-la
caía na sua própria raiva, dando-se conta de
que também tinha sido vencido. Pregou-lhe uma canelada
e recusou-se chorar como chorávamos.
Era uma casa clamando pelos seus próprios fantasmas.
Um dia aprendemos a deitarmo-nos
com a cabeça presa entre mãos,
recordando os seus velhos nomes,
o pó frio do chão na cara,
para lembrar esse torrão-natal que apenas conhecíamos
das histórias. As vozes dos mortos
nunca são aquilo que esperamos, trovão distante
nos montes baixos, o uivar do cão
ao longe, silêncio.
E este torrão-natal é um lugar qualquer que
tenhamos de abandonar. As vozes
implorando o nosso regresso são ilusórias.
Agora já viajei até ao fim do mundo, temendo os mortos.
Insistem ainda em falar através de mim.
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