sou o fantasma holofote
instalado em nicho escuro
aqui tem coisa sus-
surra a jóia surripiada
ofuscada por mim ao voltar da festa
sou um espantalho sou olhado
no ovo recheado da minha dor
e a ave que deixa o filhote
espatifar-se no chão (é a sua espécie)
nasce com olhos meigos
sou o grande caos após o incêndio
sou o mobiliário gotejante
que ainda fumega e sou o torcer de mãos
o beber aguardente na noite húmida
sou a constipação após o grande incêndio
sou o tirano pálido na manhã alva
o seu relógio vai atrasado mas o coração antecipa
a sentença de morte e uivo
ao cheiro de carne humana
embora não goze tal delícia há anos
sou a rapariga que na minha memória
encontro na colina florida
converso com ela tão meigamente como a brisa estival
fala ao convalescente
ela é muito pálida e tem rosto de memória
sou a voz que não dá voz
ao que já tem voz
mas que sobre o silêncio angustioso
coloca a imagem miracular de uma palavra
e só depois alheio a todo o medo
se sabe o que eu quis dizer com tudo isso
o poema é amuleto
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